quarta-feira, 20 de outubro de 2010

A minha primeira vez


Desde cedo a minha paixão por motas despertou e foi com 10 anos que chegou as minhas mãos uma Kawasaki 50cc preta que se encontrava adormecida entre os becos das ruas confusas de Macau. A mota parecia abandonada, mas depois de ficar arranjada, parecia acabadinha de sair do stand e não era a ferrugem instalada nos amortecedores que me iria roubar aquele momento de felicidade, provavelmente o maior de infância, a minha primeira mota! No meio de milhões de scooters com aquele barulho irritante, aquela mota tinha algo de diferente, não era concretiza a sua beleza porque bonita não era mas sim algo de especial, talvez o facto de ter mudanças e só isso, para mim, era uma questão a que dava muito valor.

Não sabia andar mas tinha uma noção: o meu pai dizia que era a 1º para baixo e todas as outras para cima e lá ia eu devagarinho nas terras do istmo de Coloane, que agora já não existe, tendo sido substituído por mais hotéis e casinos que se tornaram cenários habituais na cidade de Macau. Lembro-me que era aos fins-de-semana que mais andava na mota. Ou porque me portava bem ou não tinha negativa num teste da escola, já era motivo mais que suficiente para o meu pai me levar a dar uns giros. Isto acontecia quando a mota pegava, pois existiram grandes momentos de tenção da minha parte, quando via o meu pai a dar ao kiko, a suar por todos os lados e a bufar por não obter nenhuma resposta, eram momentos difíceis para mim, pois não queria ir para casa sem ter tido aquele prazer e aquela adrenalina. Foram muitas as vezes em que ‘’roubava’’ a chave ao meu pai e ia para a garagem sentir a liberdade de andar e, aos poucos, começava a dominar aquela motinha que mais parecia um brinquedo. E passar com ela pela ponte nova? Sobrevoando o riu das Pérolas, por vezes, não era tarefa fácil, quando o vento soprava com mais intensidade a mota já não andava bem em linha recta.

Momentos simples mas marcantes e sentido de liberdade foi aquilo que senti com a minha primeira mota, talvez seja assim com o que acontece pela primeira vez...

Vasco C.


sexta-feira, 15 de outubro de 2010

A mota que sonhei a mota que comprei

A minha efémera passagem pelas duas rodas ocorreu em Macau, tinha eu 22 anos. Tinha lá chegado há apenas um ano e vivia com alguma intensidade e entusiasmo muito do que aquele território oferecia: exotismo, um oriente acessível, um Portugal no oriente, novas aventuras gastronómicas, uma porta para a Ásia, a possibilidade de se idealizar e logo concretizar e, claro, dinheiro relativamente fácil de ganhar.

Recordo que tudo começou num sonho. Num intenso e saboroso sonho com uma vespa. De manhã peguei no meu primo, que viveu uns tempos em minha casa, e partimos rumo ao stand mais próximo. E lá estavam umas vespas, lindíssimas. Olhei, apreciei, e fui caminhando pelo pequeno estabelecimento. É então que deparo com uma Kawasaki ZZR 600. Um motão, azul e cinza, com um imenso farol à frente e um banco preto corrido. Duzentos e setenta quilómetros de velocidade máxima e 5,7 segundos dos zero aos 100. Aquilo sim, era uma máquina. Após umas sábias trocas de opinião com o meu primo que, tal como eu, também nunca tinha andado de mota, tomei a decisão óbvia: levar a ZZR 600. Tratei do pagamento e com a ajuda do lojista coloquei a mota cá fora, à porta do stand. Algo me deixou de imediato desconfortável: a sacana tinha mudanças de pedal. Nada de mudanças de mão, como as vespas que eu conhecia. Mas Macau era assim, e nós já tínhamos imbuído que tudo se resolvia. E resolveu. Telefonei ao meu tio, que trabalhava ali próximo e também tinha uma mota, e ele garantiu-me que passava por ali daí a uns minutos, para eu não me preocupar. Descansei e esperei. O lojista achou estranho, eu e o meu primo ali sentados no passeio, ao lado da mota acabadinha de comprar. Mas eu disfarcei, e disse-lhe que me tinha esquecido da carta de condução. Foi então que me deparei com outro problema – é que eu não tinha carta de condução. Mas o meu primo tranquilizou-me: já tens o mais difícil e caro, a mota. Deixa que logo tiras a carta. E era verdade: quantos jovens de 21 anos sonham com uma vespa e compram uma 600? Normalmente é ao contrário. E quantos têm carta de condução? De facto, eu já tinha o mais difícil. Voltei a tranquilizar-me. Caramba, tinha acabado de comprar uma 600, não podia continuar naquele desassossego.

Depois de umas voltas com o meu tio numas ruas atrás da casa dele, na ilha da Taipa, tomei rapidamente a mão e o pé à mota. E durante mais de um ano gozei aquele motão. Claro que nunca passava dos 60 ou 70 quilómetros hora. Afinal estava em Macau. Ruas apertadas, um trânsito infernal, tudo o que não faz falta a uma 600. Mas quando ia às ilhas desforrava-me e lá chegava aos 160, 170. Entretanto, como ganhava bem tomei o gosto aos blazers. Caiam-me bem. Tinha-os de várias cores, do vermelho ao azul claro. Algo que ao vento numa mota, quando desapertado, dava um efeito estranho aos olhos de terceiros, tipo vela, algo que só percebi quando uma amiga minha, a Cláudia, já desesperada, me fotografou e com um ar esperançado atirou: «Vês, é isto, é isto que te dizia, é assim que andas por aí em Macau». Percebi, reconheci que não era o melhor estilo, mas continuei; um blazer é sempre um blazer, mesmo a esvoaçar numa mota, pensei. Mas não andei por muito tempo. Uma noite, depois de uma festa, mandaram-me parar numa operação auto-stop. Até então, sempre que o faziam, eu respondia prontamente que tinha a carta em casa e mandavam-me seguir. Apanhava sempre polícias chineses, que desejavam tudo menos agitações linguísticas. Naquele dia à minha frente estava um macaense, daqueles chatos que gostam de demonstrar que dominam a língua portuguesa. Azar. Nada a fazer. Até porque a Cláudia, que ia atrás na mota, também não ajudava nada, com o capacete numa mão e uma Jonnhie Walker Black Label na outra. E ainda por cima teimava em falar, em dizer qualquer coisa que ninguém percebia, agitando a garrafa. Dois dias depois estava no Tribunal, em frente ao Juiz. Lá se foi a mota em Macau, pensei, esquecendo momentaneamente o que era Macau. Eis então que o Juiz, com um sorriso entre o complacente e o reprovador, me diz: «você é o Miguel Correia jornalista no jornal Comércio de Macau?». Respondi que sim, que era. «Bem, sabe que para andar de mota é preciso carta. Mas eu até gosto dos seus textos. Vá-se lá embora mas garanta-me que tira a carta». Eu lá garantir garanti, mas não tirei. Uns meses depois estava a caminho de Portugal, de vez. Tinha decidido terminar a minha aventura asiática com uma volta de uns quantos meses pela Ásia e Europa. Macau era assim…

Nunca mais andei de mota, até o meu tio, já em Portugal e 20 anos depois, me empurrar há uns meses para umas voltas numa vespa dele. A vespa que nunca tive e com a qual um dia sonhei. E na qual finalmente andei.

PS: dizer apenas que quem me comprou a 600 em Macau seguiu em frente, uns meses depois, numa curva no Altinho de Coloane. A mota foi-se e ele partiu as duas pernas. Quanto a mim, nunca aquela Kawasaki me atirou ao chão.


MC


tin tàn ché




Confesso que de duas rodas só me lembro da chatice que era estar em Macau na altura do Grande Prémio, evento que anualmente queima litros de gasolina e desgraça a paciência de quem mora num raio de menos de 1km do circuito. É um bocado como o Novo Ano Chinês: da primeira vez acha-se graça mas na segunda já se quer estar longe!

Mas quanto a motas Macau tem mais alguma coisa: milhares e milhares de scooters (chinesas, claro) que invadem as ruas e arruamentos, da Travessa das Bruxas à Rua da Felicidade, e servem para tudo, desde carregar patos a veículo de vinganças mafiosas… isto antes de 1999, que agora Kilates só de ouro bem amarelo.

Sim, que Macau não é só árvre di pataca, como lembrava Adéno seu doci papiáçam di Macau (tive hoje a triste notícia da recentissima morte de Henrique Senna Fernandes e autor do romance Amor e Dedinhos de Pé)…

Bem, vamos ver, motoreta, lambreta, scooter, tin tàn che (em cantonense...), vespa…vespa…Macau…já sei, lembra-me Abelha da China, o primeiro jornal de estrutura Ocidental a ser publicado na China, sim a tal de Gaspar (esta foi um bocado forçada, mas até nem calhou mal!).

Claro que poderia falar nos Riquechós, embora aqui as rodas sejam 3 e motores ainda não existam, mas como agora apenas servem para turistas nostálgicos passearem as poucas patacas que escaparam à sofreguidão do casino, enquanto desfiam shes e tches "mandarinenses", também não será por aí que as lembranças abundem. Longe vão os tempos em que Camilo Pessanha voltava a casa depois de ter sonhado com a distante amada Ana de Castro Osório, reclinado no estofo do riquechó, bem cheio de substancias que ajudavam ao devaneio!

Que mais? Bicicletas? Isso é na Mãe China, não neste Ou Mun onde a política "um pais dois sistemas" aguentou e em muitos casos desenvolveu alguns dos aspectos positivos da presença portuguesa, como a boa rede de transportes.

Em resumo: embora tenha tocado aqui e ali no tema, as duas rodas para mim são passarinhos quadrupedes...


JC


sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Spanish musical-Concha Velasco-Vespa

Haverá experiência mais horrorosa relacionada com motas que isto?

As recordações do CHICO

Ah lembrei-me do seguinte:
Em Luanda o Zé Pino (um dos maiores guitarristas de Angola, do seu tempo) e o Vitor Chaby compraram cada um uma Honda 50 cc. Eu (Chico) e o Correia compramos, aconselhado pelo célebre Peras (um dos mecanicos da loja onde comprámos as motos e tb corria em motos e depois em carros), cada um uma Kawasaki 50 cc, a minha vermelha e a dele preta.
Certo dia fomos para a estrada dos quarteis fazermos uma corrida...que desilusão eles passaram por nós com uma pintarola...
O resto do pessoal com mota (Jaime Mendo, Rui, Ramos) fartaram-se de rir!
Tinhamos comprado uma mota que nao andava nada... é a vida...que nunca mais volta.
PS - Era a altura de conjuntos famosos, com gente como o Fausto